ABRAÇOS
Gilberto Martins
Àquela hora da manhã a igreja estava praticamente vazia. Apenas alguns fiéis, lá adiante junto ao altar, silenciosamente faziam suas costumeiras orações. Sentei-me em um dos últimos bancos e pus-me, à minha maneira, a conversar com Deus. De repente vi que por uma das portas laterais do templo acabara de entrar uma jovem senho-ra. Pela aparência, percebi que se tratava de uma mulher de pouco mais de trinta anos. Estranhei quando ela se aproximou de uma pessoa sentada junto à porta e deu-lhe um abraço demorado. Por certo a recém-chegada havia encontrado ali alguém de seu conhecimento, provavelmente uma amiga que não via há muito tempo. Não dei atenção ao que estava acontecendo. Apenas baixei os olhos e voltei ao meu monó-logo com o “Dono da casa”. Entretanto, movido por uma curiosidade quase instintiva, tornei a olhar para a frente e me deparei com a mesma mulher abrindo os braços para abraçar outra pessoa, desta vez um homem já idoso, acompanhado de uma mulher, provavelmente pela esposa. Em segundos os dois haviam sido abraçados, e a partir dali outros tantos receberam aquele mesmo gesto de carinho. Por alguns instantes imaginei que por certo aquela mulher seria uma das pessoas responsá-veis pelos cuidados da igreja. E por isso mesmo deveria conhecer todos aqueles aos quais dispen-sava tamanha cortesia e afeição. Todavia, ao ver que aquele gesto se repetia com quase todos ali presentes, por um momento imaginei tratar-se de uma pessoa com problemas psíquicos. Afinal, somente uma louca se predis-poria a abraçar tantos quantos encontrasse pela frente. Tentei voltar ao que anteriormente fazia, mas não consegui por perceber que a mulher seguia naquele momento em minha direção. Olhei à minha volta tentando encontrar alguém que pudesse ser o seu próximo alvo. Entretanto, ali nos últimos bancos da igreja não havia pessoa alguma além de mim. Por um momento pensei em deixar aquele lugar, mas não houve tempo. Como num passe de mágica a mulher se postou diante de mim. Tinha já os braços abertos e um sorriso que deitou por terra todas as minhas supostas pretensões de ir embora. Percebi então que não havia como escapar do que estava por vir. Pus-me de pé e deixei-me também abraçar como tantas outras pessoas assim o fizeram. Aquele abraço, afetuoso, livre de qualquer interesse, expressão máxima de um amor profun-do por outro ser humano, remeteu-me a tantos abraços que, ao longo da vida, não tive oportunidade de dar ou receber. De imediato lembrei-me do dia da partida de meu amado filho. Ia embora de casa o meu menino. Abracei-o na porta e fiquei por alguns instantes agarrado a ele. Queria alongar aquele abraço até fazer com que ele perdesse o horário de tomar o ônibus... e não partisse. Mas claro que no dia seguinte ele seguiria o seu destino. Porém teria valido a pena. Pelo menos mais um dia eu seria feliz junto dele.Ainda nos braços daquela mulher, pessoa que por certo nunca mais veria, ouvi as seguintes palavras: – Para mim esta é a melhor hora do dia. Mas afinal o que queria dizer ela com aquela frase? Só depois de ter deixado aquele lugar, pude compreender ao que ela estava se referindo. A melhor hora do dia será sempre aquela quando abrimos os nossos braços e aproximamos os nossos corações uns dos outros.
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