Nando da Costa Lima
Conquista era muito mais poética, devia ser um lugar ótimo para residir. Não que tenha deixado de ser, mas é que antes devia ser muito mais divertido, pois é muito raro num lugarejo como era Conquista antigamente habitar tantos poetas do calibre de Camilo de Jesus Lima, Jesus Gomes dos Santos, E. Menezes, Clóvis Lima, Claudionor Brasil, Bruno Bacelar e Íris Geraldo da Silva; este, para mim, o melhor poeta que nossa terra já teve. Um poeta na íntegra, não só pela beleza e clareza dos seus versos, mas por ter feito da vida uma poesia. Na juventude desses homens, as diversões aqui encontradas eram pouquíssimas, e sendo assim eles aproveitavam de maneira intensa não só os acontecimentos da nossa cidade mas de todos os lugarejos vizinhos. De casamento a velório, tudo era motivo pra colocar sapato novo, pois eram as oportunidades que encontravam pra flertar as moças solteiras da época.
Foi num desses divertimentos que
aconteceu um fato interessante. Havia em um lugarejo vizinho uma doida
conhecida como "Maria Jararaca". Era dessas figuras que aparecem não
se sabe de onde, mas com a convivência diária transforma-se em parte da cidade.
Uma figura inofensiva de quem todos gostavam, tanto que ela participava de
tudo, talvez até como gozação, mas ninguém tinha malícia com ela. Gostavam de
curtir as coisas engraçadas que ela sempre tinha pra falar. Banalidades, mas
que sempre faziam rir, por isso Maria estava presente em todas. Quando não, o
pessoal sentia sua ausência e mandava buscá-la.
Quando a cidade ficou sabendo que ia
ter um casamento de rico naquele ano, o povo quase endoidou. Uma festança de 3
dias e 3 noites. Os pais dos noivos ficaram disputando quem gastava mais com os
preparativos: se um matava um boi, o outro matava dois, e a disputada era comentada
em toda a região. Todo mundo foi convidado, e uma semana antes as roupas já
estavam engomadas e os sapatos lustrados, só esperando o dia do arrasta-pé. A
festa ia ser tão boa que vinha gente até de Poções e Itambé.
No dia do casório a praça da igreja
tava tão cheia que parecia show de Luiz Gonzaga, mas as famílias estavam
preparadas para dar comida e bebida ao dobro. O casamento foi lindo, um dos
mais bonitos visto na época (segundo os presentes). O problema foi na saída,
pois no justo momento em que os noivos saíram da igreja, ia passando Maria
Jararaca. Os pais dos noivos ao vê-la, chamaram: "Maria, o casamento dos
nossos filhos, um momento tão alegre pra nós e você passa assim de cabeça
baixa, fala alguma coisa pros noivos!". Todos os convidados fizeram
silêncio, Maria encostou nos noivos, passou a mão na barriga da noiva e
perguntou em voz alta: "Minha filha, você desconfia de quem mesmo,
hein?". Ninguém sabia que ela estava grávida...A noiva saiu em prantos e o
noivo de cabeça baixa. Não houve mais festa, Jararaca jogou um balde de água
fria no acontecimento do ano, principalmente no noivo que achava que a sua cara
metade ainda era virgem. Pouco tempo depois Maria Jararaca foi
encontrada morta numa das estradas que ela percorria, o que pra época foi perfeitamente
normal. Naquele tempo, mesmo sendo doida, fazer uma pergunta daquelas à uma
noiva e permanecer viva, só se fosse na Europa! Mas isso é coisa de um passado
remoto, pois hoje a nossa cidade é vista como uma das dez melhores do país!
Apesar de ser paradoxal apontá-la como uma das melhores cidades para morar e ao
mesmo tempo ser a 36ª mais violenta do mundo. Será que existem duas Vitória da
Conquista?
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