Republicano não mencionou o país em sua campanha, mas tem um
elemento de imprevisibilidade que pode prejudicar as relações com os
brasileiros.
Donald Trump discursa após ser declarado vencedor nas
eleições, em Nova York, na madrugada de quarta (9) (Foto: Reuters/Mike
Segar)
Em um triunfo inesperado, o republicano Donald Trump
foi eleito o novo presidente dos Estados Unidos. Trump conquistou
vários Estados-pêndulo, onde os resultados eram imprevisíveis – podiam
favorecer tanto um quanto o outro partido -, como Flórida, Ohio e
Carolina do Norte, garantindo vantagem sobre Hillary Clinton.
Sua vitória não era indicada pelas pesquisas de opinião, que apontavam Clinton como novo presidente.
Mas como o êxito do republicano impacta no Brasil? Leia a seguir os principais pontos de contato entre os dois países.
Economia e comércio
Vários aspectos devem ser levados em conta para responder a questão.
Um deles é a maneira como os dois candidatos e seus partidos encararam a economia e as relações comerciais entre os Estados Unidos e o resto do mundo.
O Brasil se beneficiaria de uma maior abertura dos EUA a produtos
brasileiros. Hoje os EUA são o segundo maior parceiro comercial do
Brasil, atrás da China.
Historicamente, o Partido Republicano, de Trump, defende o livre
comércio e se opõe a medidas protecionistas que ajudassem empresas
americanas a competir com estrangeiras.
Assim, um candidato republicano tenderia a ser melhor para os interesses econômicos do Brasil do que um candidato democrata.
Mas Trump inverteu essa lógica ao propor renegociar os acordos
comerciais firmados pelos EUA para preservar empregos no país e reduzir o
déficit americano nas transações com o resto do mundo.
Se o empresário colocar essas ações em prática, o Brasil poderia ser prejudicado.
A professora de Relações Internacionais da ESPM Denilde Holzhacker
afirma que as consequências seriam imediatas e negativas, e causariam o
que muitos economistas estão chamado de “efeito Trump”.
“Como ele fez propostas muito amplas e populistas, o efeito econômico
dessas medidas podem ter impacto grande e gerar um caos na economia –
principalmente porque ele é contrário ao livre comércio, se mostrou
protecionista.”
Mas Holzhacker faz uma ressalva sobre a aplicação dessa medidas.
“Agora, para saber o quanto ele vai conseguir implementar disso,
vamos ter que esperar. Ele é tão imprevisível e tudo fica tão indefinido
que prejudica muito o cenário econômico.”
Imigração e vistos
Estima-se que um milhão de brasileiros vivam nos EUA, boa parte em situação migratória irregular.
Trump propôs construir um muro na fronteira do país com o México e prometeu deportar todos os imigrantes sem documentos.
Ele diz que protegerá o “bem-estar econômico de imigrantes legais” e
que a admissão de novos imigrantes levará em conta suas chances de obter
sucesso nos EUA, o que em tese favoreceria brasileiros com alta
escolaridade e habilidades específicas que queiram migrar para o país.
Evento de latinos em apoio a Trump, que promoteu construir um muro para evitar entrada de imigrantes
Outro tema de interesse dos brasileiros é a facilidade para obter
vistos americanos. Trump fez poucas menções ao sistema de concessão de
vistos do país.
Hoje, Brasil e EUA negociam a adesão brasileira a um programa que
reduziria a burocracia para viajantes frequentes brasileiros, como
executivos. A eliminação dos vistos, porém, ainda parece distante.
Para que a isenção possa ser negociada, precisaria haver uma redução
no índice de vistos rejeitados em consulados americanos no Brasil, uma
exigência da legislação dos EUA.
Relação com o Brasil
O Brasil e a América Latina não foram tratados como temas prioritários nas campanhas dos dois candidatos.
Em 2015, Trump citou o Brasil ao listar países que, segundo ele,
tiram vantagem dos Estados Unidos através de práticas comerciais que ele
considera injustas. A balança comercial entre os dois países, porém, é
favorável aos EUA.
Como empresário, Trump é sócio de um hotel no Rio de Janeiro e
licenciou sua marca para ser usada por um complexo de edifícios na zona
portuária da cidade. Anunciada em 2012, a obra ainda nem começou.
Para a professora de Relações Internacionais da Unifesp Cristina
Pecequilo, como Trump não falou nada sobre o país e se distanciou de
temas ligados à América Latina, não deve haver muitas mudanças para os
brasileiros. No entanto, diferentemente de Hillary, o republicano tem o
elemento de imprevisibilidade.
“A situação do governo Hillary para o Brasil teria sido mais
tranquila porque era mais previsível por qual caminho ela iria. Seria a
continuidade do governo Obama, de uma dimensão política que tem o
reconhecimento do Brasil como relevante, sem muitas mudanças.”
Pecequilo afirma que o país deve perder relevância na visão dos Estados Unidos dado o conturbado cenário interno.
“Eles estão com tanto problema dentro de casa, que o Brasil não é uma preocupação.”
Relação entre Brasil e EUA também vai depender de química entre Temer e Trump
Questão de química
Especialistas nas relações Brasil-EUA costumam dizer que os laços entre
os dois países dependem em grande medida da química entre seus líderes,
independentemente de seus partidos ou ideologias.
Eles afirmam que, embora seguissem tradições políticas bastante distintas, os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2011) e George W. Bush (2001-2009) tinham uma relação tão boa quanto a mantida entre FHC (1995-2002) e Bill Clinton (1993-2001), que tinham maior afinidade ideológica.
Já a relação entre Barack Obama e Dilma Rousseff nunca foi tão próxima e sofreu com a revelação de que o governo americano havia espionado a presidente brasileira.
Analistas afirmam ainda que Brasil e EUA têm relações bastante
diversificadas e que os laços devem ser mantidos qualquer que seja o
resultado da eleição em novembro, já que os dois governos dialogam
dentro de estruturas burocráticas.
Do lado brasileiro, há interesse em se aproximar mais dos EUA, vença
quem vençer. Em entrevista à BBC Brasil em julho, o embaixador
brasileiro em Washington, Sérgio Amaral, disse que o governo Temer
investiria nas relações com as cinco principais potências globais (EUA,
China, Rússia, França e Reino Unido).
Amaral afirmou ainda que, na Embaixada, priorizaria áreas em que
Brasil e EUA têm maior convergência, como direitos humanos e meio
ambiente.
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