
Quando
a gente entrava em casa bêbado e tomando cuidado pra não chamar a
atenção do “velho” e o encontrava roncando em frente à televisão ou
talvez fingindo que estava dormindo pra não ter que suportar prosa ruim
de biriteiro, tinha a impressão de que ali estava um homem com a
verdadeira sensação de missão cumprida… Mas hoje vemos que estávamos
redondamente enganados, acho que ninguém parte com a sensação de ter
feito tudo que queria na vida, só os mentirosos. Somos todos ventilados
por aquele poema de Borges que quando lemos ainda jovens achamos que
podemos mudar o rumo da História, mas 20 ou 30 anos depois vamos notar
que nem andamos pelo mundo, quando muito demos foi uma voltinha.
Passamos a nos sentir solitários mesmo quando acompanhados, nos sentindo
como profissões que hoje já nem mais existem, como telefonista,
professor de datilografia, datilógrafo, etc. É uma porra se sentir
obsoleto mesmo ainda tendo pique pra jogar várias partidas. É assim que
me sinto, estou com quase sessenta anos e acho que não fiz quase nada e
que já não tenho tempo pra fazer o que gostaria.
Meu
universo é como uma caixa de sapatos toda furada pra que o ar circule e
a luz entre. E o pior é que há anos atrás eu achava que já tinha
chutado o pau da barraca, feito de tudo… Que inocência! E olha que eu
nem passo de longe na relação dos privilegiados, estes (acho eu) sofrem
mais ainda, é o caso do artista quando esquecido pela mídia ou qualquer
outro profissional liberal que naturalmente é engolido pelo tempo e já
fica sendo olhado pelos mais jovens como antiquado, apesar de ter dado o
que tinha de melhor profissionalmente. Não somos nós que nos sentimos
velhos, são os jovens que (naturalmente) nos olham como idosos… O tempo é
mesmo foda, quando eu lembro que ainda ontem eu estudava na Escola
Jorge Teixeira do famoso professor Antônio Moura. Eu sinto saudade até
da palmatória de jacarandá que tanto medo me causava. Tudo era tão
lindamente diferente, casa cheia, pai e mãe fazendo tudo que podiam,
irmãos e irmãs, Dida. As épocas tinham cheiro, o Natal, o São João, o
Carnaval, tudo tinha um aroma peculiar, tudo era magia na cabeça do
menino que se recusava a crescer. Daquele jeito tava bom demais… a rua
da Granja era um universo a parte tinha tudo que eu gostava,
principalmente a amizade, na infância ela é bem mais sincera. Tão
sincera que envelhece junto a nós sem perder o brilho. Tempo filho da
puta… eu tô querendo viver só mais sessenta. Para, porra, senão daqui a
pouco você vai falar que tá com saudade de Don e Ravel cantando “Eu te
amo meu Brasil”. Aí sim o pessoal vai achar que você tá caducando, só
falta você intitular a crônica com a frase que era o Pai Nosso do regime
militar “Brasil, ame-o ou deixe-o”. É… Tô caducando mesmo, citar uma
merda dessa numa crônica é como elogiar quem não merece . E eu até
sonhei que a mamoneira tinha voltado a funcionar… parece que eu tô
naquela fase da vida em que o menino, foi não foi se apresenta.
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