terça-feira, 9 de junho de 2020

CONSÓRCIO DO NORDESTE X RESPIRADORES:

Ação sobre compra de respiradores vai ao Superior Tribunal de Justiça

Rodrigo Aguiar e Bruno Luiz
A TARDE 

Foi encaminhado para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) o processo relacionado à Operação Ragnarock, que investiga suposta fraude na compra de respiradores pelo Consórcio Nordeste, presidido pelo governador Rui Costa (PT). Cabe à Corte, em função do foro privilegiado, processar e julgar governadores. O processo, que corre em segredo de Justiça, tramitava no Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA).
BRUNO DEUSTER ACUSADO DE FECHAR A COMPRA
O governo do estado não se manifesta sobre o assunto porque o caso está relacionado ao consórcio, mas informou em nota ontem que a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) entrou com recurso para manter o caso na Justiça baiana. A PGE contestou decisão da juíza da 2ª Vara Criminal, que alegou que não seria da sua competência julgar o processo. Já o secretário executivo do Consórcio Nordeste, Carlos Gabas disse que “no momento oportuno o consórcio vai se manifestar, pois não pode correr nenhum risco de atrapalhar as investigações em curso”.
Os nove estados nordestinos pagaram quase R$ 49 milhões por 300 respiradores, que não foram entregues. Citado pela empresária Cristiana Prestes, detida na operação, como responsável pela negociação dos respiradores, Bruno Dauster pediu para deixar a Casa Civil do governo do Estado na 5ª-feira (4) por “motivos pessoais”. A TARDE não conseguiu entrar em contato com o ex-secretário.
Em reunião virtual ontem, a Comissão Parlamentar Interestadual de Acompanhamento e Fiscalização do Consórcio Nordeste decidiu pedir à Polícia Federal (PF) que investigue a suposta fraude na compra dos equipamentos. Os deputados participantes do colegiado também decidiram solicitar investigações pelas polícias civis estaduais, além de pedir informações aos governos estaduais sobre a aquisição dos respiradores, sobre a estrutura administrativa e despesas de manutenção do consórcio.
Pela Bahia, participaram os deputados Sandro Régis (DEM), líder da oposição na Assembleia Legislativa, Alan Sanches (DEM) e Tiago Correia (PSDB). “No caso da compra dos respiradores, a Bahia fez a compra em nome dos outros estados. Ou seja, o governador da Bahia, Rui Costa (PT), como presidente do consórcio, fez um convênio com ele mesmo para que, através da Secretaria da Saúde (Sesab), comprasse os respiradores. Isso precisa ser esclarecido”, afirmou Sandro Régis, em nota.
Já na avaliação do deputado Thiago Correia, essa compra deveria ter passado pelo crivo das procuradorias dos demais estados. Na ata de constituição do consórcio, à qual os parlamentares da comissão ainda não tiveram acesso, está escrito que os pareceres jurídicos da procuradoria da Bahia, por ser estado líder, seriam suficientes.
Operação
Na última segunda-feira, 1, foram presos Cristiana Prestes, dona da Hempcare, o seu sócio Luiz Henrique Ramos, e o empresário Paulo de Tarso. Na transação com a HempCare, a Secretaria de Segurança Pública (SSP-BA) informou que o estado da Bahia teve um prejuízo de aproximadamente R$ 10 milhões, valor antecipado à empresa, ao custo de R$ 160 mil por cada respirador. Os outros estados integrantes do consórcio pagaram, cada um, por 30 respiradores. Na sexta-feira, 5, os três foram soltos, ao fim do prazo da prisão temporária
Investigação na Bahia
A Polícia Civil da Bahia suspeita que as empresas HempShare e Bioenergy usariam os R$ 48,7 milhões pagos pelo Consórcio Nordeste na produção de respiradores não autorizados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) - irregulares, portanto. As duas são investigadas por fraude na entrega de 300 ventiladores comprados pelos nove estados da região para uso no enfrentamento ao novo coronavírus.
Ao cumprir mandados de busca e apreensão na sede da Bioenergy em Araraquara (SP), a Polícia Civil de SP, que auxiliou a Secretaria de Segurança da Bahia (SSP) na Operação Ragnarok, não encontrou nenhum respirador pronto, o que reforçou as suspeitas dos investigadores.
Contratada pelo Consórcio para entregar os equipamentos, a HempShare acordou junto aos compradores que eles seriam importados da China e fornecidos aos estados. No entanto, os prazos de entrega estabelecidos vinham sendo descumpridos reiteradamente. Sempre que procurada a dar explicações, a empresa alegava que o atraso era culpa de problemas mecânicos nos respiradores da fornecedora internacional.
A HempShare propôs que a Bioenergy realizasse a fabricação no Brasil a preços menores e que, caso a substituição fosse aceita, cerca de 400 respiradores seriam entregues, 100 a mais que o previsto no contrato. Mas a polícia suspeita que, além de não ter os respiradores prontos, eles seriam produzidos fora das especificações pedidas pelos estados e pela Anvisa.
“A empresa nunca teve os equipamentos. Tudo indica que já era uma fraude, já tinham em mente isso. Nunca pretenderam entregar os equipamentos importados", chegou a afirmar a delegada Fernanda Asfora, coordenadora do setor de Crimes Econômicos e Contra a Administração Pública.
“Havia indícios de que não se tratava de descumprimento contratual, mas de fraude. Diversas justificativas vinham sendo usadas pela empresa pela não entrega do equipamento e a não devolução do dinheiro, entre elas a de que estavam sendo adquiridos respiradores nacionais. Isso não havia sido pactuado no contrato”, destacou ainda o titular da SSP, Maurício Barbosa, em entrevista coletiva para apresentar os resultados da operação.
A Justiça chegou a bloquear R$ 48,7 milhões em bens da HempShare por ter deixado de entregar os respiradores. As duas empresas investigadas ainda planejavam vender os ventiladores irregulares por todo o país e negociavam fornecer os produtos aos hospitais de Campanha e de Base do Exército, em Brasília, segundo a SSP.
Durante o cumprimento de um mandado em Brasília, a polícia apreendeu um respirador, mas os investigadores baianos acreditam que a peça era de mostruário, apenas para apresentação a possíveis compradores. Há suspeita também de que uma das empresas fosse usada para lavagem de dinheiro. Segundo o secretário Maurício Barbosa, o inquérito iria se concentrar na análise do que foi apreendido na operação e do bloqueio de 150 contas bancárias autorizado pela Justiça.
Batizada de Ragnarok, a operação efetuou duas prisões no Distrito Federal e uma no Rio de Janeiro. Foram cumpridos também 15 mandados de busca e apreensão, alguns deles na capital paulista e em Araraquara, onde fica a Bioenergy. Em Salvador, o edifício TK Tower foi alvo da polícia.
O inquérito foi aberto pela Polícia Civil baiana após o secretário-executivo do consórcio, Carlos Gabas, denunciar que a revendedora não estava cumprindo os prazos para entrega dos ventiladores, que seriam importados da China. Conforme o contrato, o primeiro lote, com 150 respiradores, deveria ter sido repassado aos estados em 18 de abril, e o segundo, com a outra metade, em 23 de abril.

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