Politização da saúde
Carlos Albán González - jornalista
Prefeito, o senhor, por
pouco, não cometeu suicídio político, caso fosse mantida a abertura do
comércio esta semana. O repúdio da população de Vitória da Conquista ao
seu ato se manifestaria nas eleições marcadas
para outubro próximo. O clamor popular impediu o seu gesto trágico e
impensado, sob pressão da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL), um dos
suportes de sua carreira política. Deve também ter pesado
na
sua disposição de revogar o decreto anterior o cenário caótico que se
instalou no Centro da cidade, na manhã/tarde de segunda-feira, com
pessoas
aglomeradas e o trânsito congestionado, causado pelo fechamento da
avenida Lauro de Freitas.
Pesquisa Datafolha
mostra que apenas 24% dos brasileiros são contrários ao isolamento
social, a principal medida para frear o avanço do Covid-19, defendida
pela Organização Mundial de Saúde e pelas mais conceituadas
autoridades médicas e científicas do mundo. Mas, entre aqueles que
acham que salvar a economia é mais importante do que salvar uma vida
humana está o presidente Jair Bolsonaro, o mentor religioso e político
do prefeito Herzem Gusmão Pereira.
Antes de Bolsonaro, o
prefeito adotou como padrinhos políticos os irmãos Jeddel e Lúcio Vieira
Lima, condenados pelos crimes de lavagem de dinheiro e associação
criminosa. Somente Jeddel cumpre pena em regime
fechado. O erro na escolha não abriu os olhos nem a mente de Herzem,
que transferiu seu devotamento para o ex-presidente Michel Temer,
acusado pelo Ministério Público – chegou a passar uma noite na cadeia -
de formação de quadrilha.
O momento cruciante que
o país atravessa deve servir para promover a união de todos,
principalmente dos governantes. Mas, o que estamos assistindo, em
Brasília e em Vitória da Conquista, é o ódio aflorando contra
os adversários. Estão politizando a saúde. Bolsonaro acusa os
governadores Wilson Witzel (Rio) e João Dória (São Paulo) de estarem
obstruindo seu projeto político, ao se posicionarem a favor do
isolamento social; Herzem imputa ao governo do estado a falta
de ajuda para combater o novo coronavírus. Ambos têm um mesmo ideal: um
segundo mandato.
Não se pode negar que
Herzem Gusmão teve 85% dos votos dos eleitores das classes A e B,
revoltadas, com razão, com os escândalos financeiros praticados por
membros do PT. Mas isso não é motivo para ele governar
apenas para os ricos, esquecendo-se da periferia.
Há uns quatro meses a
prefeitura devolveu aos empresários do comércio as vagas de
estacionamento no Centro, deixando de renovar o contrato com a
Estacionamento Digital, em prejuízo de centenas de clientes que
tinham créditos na empresa, e não receberam seu dinheiro de volta. Há
dois anos, a pedido do CDL, o carnaval conquistense saiu das ruas, sob o
argumento de que os foliões faziam xixi nas portas das lojas. Há poucos
dias, os toldos dos pontos de ônibus do Terminal
da Lauro de Freitas foram demolidos e a avenida foi fechada à passagem
de veículos, prejudicando as pessoas que usam o transporte coletivo.
O conquistense já
observou que as autoridades municipais estão subestimando a força letal
do Covid-19, que, até hoje (dia 9), já contaminou 15 pessoas e com mais
de 60 aguardando a coleta de material para teste,
devido a falta de kits. A prefeitura não se preparou convenientemente
para a chegada do vírus, chegando, inclusive, a recusar recursos
liberados pelo estado, da mesma forma que se opôs à implantação da
Policlínica. Não se viu aumento do número de leitos em
UTI, montagem de hospital de campanha, aluguel de hospitais da rede
privada, aquisição de respiradores pulmonares, máscaras, luvas e
desinfetantes; não monitorou passageiros nos terminais rodoviário e
aéreo, e não existe um plano específico de conscientização
e ajuda médico-hospitalar para as populações da periferia e zona rural.
Prefeito, o seu mito
foi denunciado ao Tribunal Penal Internacional, com sede em Haia, na
Holanda – uma acusação inicial foi feita à Procuradoria Geral da
República que, simplesmente, arquivadou – pela Associação
Brasileira de Juristas. Segundo a entidade, Bolsonaro teria cometido os
crimes contra a humanidade e de epidemia, incentivando ações que
aumentam o risco de proliferação do novo coronavírus.
Nenhum comentário:
Postar um comentário