A crise no esporte olímpico
Carlos Albán González
Oito
meses após a realização da Rio - 2016, a cerimônia de premiação da 18ª
edição do “Brasil Olímpico”, na noite da última quarta-feira (dia 29),
não apresentou
o mesmo brilhantismo dos anos anteriores. O clima entre os atletas e a
plateia, apesar do discurso ufanista de Carlos Arthur Nuzman, presidente
do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), organizador da festa, revelava a
crise financeira que se abateu sobre o ilusório
esporte amador, com o cancelamento dos investimentos que eram feitos
pela Petrobras e por algumas empresas estatais, com a fuga de
patrocinadores e a perda de visibilidade dos atletas na mídia. Entre os
que apadrinhavam o esporte, apenas os Correios, esfacelado
com um rombo de quase R$ 3 bilhões em suas contas, se fizeram presente.
Até
mesmo o palco da cerimônia foi mudado, do suntuoso Theatro Municipal do
Rio de Janeiro para o Palácio das Artes. A impressão que se tirava do
ambiente era de
que no local iria se realizar uma solenidade militar. Mais de 80% dos
atletas de 43 modalidades que subiram ao palco para serem homenageados
ostentavam uniformes das três Forças Armadas, com as divisas de
sargento, com destaque para as jovens marinheiras.
O pugilista baiano Robson Conceição, hoje profissional, ouro no Rio,
após receber seu troféu, perfilou-se e bateu continência (para quem?).
Na
sua fala, Nuzman parece ter esquecido de destacar o apoio das
instituições militares ao esporte, através do Programa Atletas de Alto
Rendimento (PAAR) das Forças
Armadas, criado pelo Ministério da Defesa. Entre os 465 atletas que
competiram nos Jogos do Rio 145 (31,2%) recebem os mesmos soldos de um
soldado, cabo ou sargento (máximo de R$ 3,5 mil), com a obrigação única
de treinar. Dos 19 brasileiros que subiram ao
pódio 13 eram militares.
Vale
lembrar que, no período da Guerra Fria, os países do Leste Europeu, em
especial a extinta União Soviética, além da ex-Alemanha Oriental,
aperfeiçoavam seus
atletas nas Forças Armadas, como uma forma de mostrar ao mundo o
poderia do bloco socialista. Esse processo, condenado pelas nações
ocidentais, sob a alegação de que seus adversários praticavam um falso
amadorismo, mais tarde foi imitado pelos cubanos. Hoje,
os norte-americanos concentram alguns dos seus melhores atletas em
excelentes universidades, frequentadas, inclusive, por nadadores
brasileiros.
A
judoca Rafaela Silva ganhou merecidamente o prêmio de melhor atleta
feminina de 2016, além de receber a maior votação dos torcedores; o
canoísta baiano Isaquias
Queiroz, que conquistou três medalhas, levou o prêmio pelo segundo ano
consecutivo. Aproveitou a oportunidade para pedir sua noiva Laina
Guimarães, grávida de quatro meses, em casamento, ofertando-lhe um anel.
Destaque para a homenagem especial – Troféu Adhemar
Ferreira da Silva – ao técnico Bernardinho, bicampeão olímpico, e a
entrega das medalhas de bronze às participantes do revezamento
brasileiro nos Jogos de Pequim-2008.
Presidente
do COB desde 1995, graças ao apoio incondicional de mais de 90% das
confederações esportivas, o advogado carioca Carlos Arthur Nuzman, de 75
anos, reconheceu
na noite de premiação, numa entrevista com a imprensa, que o cenário do
esporte olímpico no Brasil “não é nada bom, pois os investimentos
retrocederam ao nível dos anos 90”, mesmo após o país sediar o
Pan-Americano de 2007, os Jogos Militares de 2011 e a última
Olimpíada.
Acusado
de falta de transparência na gestão de recursos, Nuzman admite que o
COB está trabalhando em busca de novos investidores. Reconhece que o
Brasil não atingiu
no Rio-2016 a meta de ficar entre os dez melhores colocados – foi o
13º, com sete ouros, seis pratas e seis bronzes. Garantiu que o país se
tornará uma potência olímpica, “ainda não será em Tóquio-2020”, o que
significa que ele tem planos de permanecer no
cargo, no mínimo, por mais sete anos.
A
crise financeira para o COB pode ser mostrada num único exemplo: em
2017, o comitê vai receber 17,3% menos recursos da Lei 10.264/2001 (Lei
Agnelo Piva), que
destina parte dos lucros das loterias federais. São esperados,
aproximadamente, R$ 200 milhões, contra os R$ 242 milhões no ano
passado. As verbas destinadas às confederações vão cair de R$ 98
milhões para R$ 85 milhões.
Obviamente,
na conversa com a imprensa Nuzman não abordou as investigações que
estão em curso na França com a finalidade de apurar a denúncia feita
pelo jornal
Le Monde, no começo de março, de que delegados do Comitê Olímpico
Internacional receberam propina para votar no Rio de Janeiro como sede
dos Jogos de 2016. Segundo o diário, a quantia de US$ 1,5 milhão foi
entregue pelo empresário brasileiro Arthur César de
Menezes Soares Filho, ligado aos governantes fluminenses, ao senegalês
Papa Diack, filho de Lamine Diack, então presidente da Associação
Internacional de Federações de Atletismo (IAAAF), repassada para
delegados africanos.
No
dia 2 de outubro de 2009, uma numerosa e entusiasmada delegação
brasileira se encontrava em Copenhague, na Dinamarca, para assistir ao
sorteio organizado pelo
COI. Capitaneados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, estavam
presentes, dentre outros, o governador e prefeito do Rio, Sérgio Cabral e
Eduardo Paes, o ministro do Esporte Orlando Silva e o presidente do COB
Carlos Nuzman.
Além
do Rio, concorriam à indicação as cidades de Chicago, Tóquio e Madri. A
capital espanhola, que liderou as três primeiras votações, perdeu no
último escrutínio
para a capital fluminense, por 66 a 32. Mais do que o resultado, o
placar revoltou os japoneses, que ficaram no terceiro lugar. O prefeito
de Tóquio, Shintaro Ishihara, levantou imediatamente a suspeita de
corrupção por parte dos brasileiros. Há evidências
de que houve irregularidades na escolha do Brasil para sediar a Copa do
Mundo de 2014 e na conquista do Mundial de Clubes pelo Corinthians em
2012.
Em
resumo, o legado deixado pelo Pan-Americano de 2007, pelos Jogos
Rio-2016 e pelo Mundial de 2014 são os estádios e equipamentos
esportivos abandonados, transformados
em “elefantes brancos”.
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