O globo em 06/10/2016
02/04/1962: João Goulart (centro), Tancredo Neves (esquerda),
Ranieri Mazzili (centro e à direita) e Ulysses Guimarães (direita)
sorriem durante a cerimônia de transmissão do cargo de presidente,
realizada em Brasília (Foto: Arquivo/ Estadão Conteúdo)
Opositor da ditadura, protagonista da
redemocratização e construtor da Constituição de 1988, Ulysses Guimarães (primeiro à direita na foto acima)
faria 100 anos neste 6 de outubro de 2016. Deixou como legado a defesa
da democracia, da ética e da conciliação pacífica.
'Doutor Ulysses'
Assim era mais
conhecido o homem que ajudou o Brasil a enfrentar momentos críticos.
Mesmo sem ter sido presidente, é uma das figuras mais marcantes da
República.
O auge da carreira foi a aprovação da
Constituição do Brasil por uma assembleia que ele, como deputado,
presidiu no Congresso. Relembre a trajetória de Ulysses Silveira
Guimarães, dos primeiros passos na política à trágica morte em um
acidente aéreo, em 1992.
Formação e carreira
Nascido em Rio
Claro, no interior de SP, em 6 de outubro de 1916, Ulysses formou-se em
1940 na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Entrou para o
movimento estudantil na época da ditadura de Getúlio Vargas e chegou à
vice-presidência da União Nacional dos Estudantes (UNE).
O primeiro cargo público veio em 1947, quando se
elegeu deputado estadual pelo Partido Social Democrático (o antigo PSD)
para compor a Assembleia Constituinte de São Paulo. Em 1950, foi eleito
para deputado federal, cargo para o qual se reelegeu 11 vezes e que
exerceu até a morte. Na breve experiência parlamentarista no Brasil, em
1961-62, foi nomeado ministro da Indústria e Comércio no governo do
amigo e colega de partido Tancredo Neves.
Luta contra a ditadura
06/11/1976: Ulysses Guimarães discursa em Santos (Foto: Arquivo/Estadão Conteúdo)
Durante a ditadura, Ulysses se contrapôs ao
regime e surgiu como líder da oposição. Ele chegou à presidência do MDB.
Eram anos de chumbo. A resistência armada estava derrotada e opositores
estavam presos, exilados ou desaparecidos.
1/5/1978:O dep. Ulysses Guimarães é barrado por
policiais quando se dirigia ao diretório do MDB em Salvador
(BA). Ele reagiu à situações como esta pedindo respeito ao líder da
oposição e dizendo que "baioneta não é voto e cachorro não é urna"
(Foto: Luciano Andrade/Estadão Conteúdo/Arquivo)
Diretas Já
Os esforços no
Congresso para redemocratizar o país culminaram em 1983 e 1984 na
campanha pelas Diretas Já, que defendia a escolha direta dos eleitores
para presidente da República. Ulysses mergulhou na campanha logo no
início. Percorreu o país fazendo discursos contundentes. “Saiam todos de
casa para defender na praça hoje o voto direto”, disse ele diante de
uma multidão.
A proposta mobilizou o país, mas foi derrotada
no Congresso. Mesmo assim, o Doutor Ulysses lutou para manter a oposição
unida. Conversava com todos em busca de acordo.
Em 1985, o PMDB cogitou lançar Tancredo Neves ou
Ulysses Guimarães para disputar a Presidência no Colégio Eleitoral.
Tancredo foi o escolhido, porque teria maiores condições de vencer. Para
o Ulysses, o importante era que o processo de redemocratização fosse
adiante.
Tancredo disputou com José Sarney, da Frente Liberal, um partido remanescente da Arena. O peemedebista venceu, mas morreu em abril daquele ano, às vésperas de assumir o mandato. Sarney acabou assumindo a Presidência e tinha como principais missões controlar a inflação e viabilizar a elaboração de uma nova Constituição, que consolidasse a democracia.
Tancredo disputou com José Sarney, da Frente Liberal, um partido remanescente da Arena. O peemedebista venceu, mas morreu em abril daquele ano, às vésperas de assumir o mandato. Sarney acabou assumindo a Presidência e tinha como principais missões controlar a inflação e viabilizar a elaboração de uma nova Constituição, que consolidasse a democracia.
Construtor da Constituição
A tarefa de
conduzir a construção da Carta Magna coube a Ulysses, eleito para
presidir a Assembleia Nacional Constituinte em 1986. Até hoje, o
político é lembrado pela grande capacidade de conciliação. Ulysses
conseguiu que a Constituição reunisse propostas e apoios de alas
divergentes da sociedade, numa época em que a abertura política fazia
reflorescer também as divisões internas do país.
Ulysses fez um discurso histórico ao assinar a
Constituição. “Num país em que 30,401 milhões são analfabetos,
afrontosos 25% da população, cabe advertir: a cidadania começa com o
alfabeto. [...] A Constituição certamente não é perfeita, ela própria a
confessa ao admitir a reforma. Quanto a ela, discordar, sim. Divergir,
sim. Descumprir, jamais. Afrontá-la, nunca. Traidor da Constituição é
traidor da pátria. [...] O inimigo mortal do homem é a miséria. Mais
miserável do que os miseráveis é a sociedade que não acaba com a
miséria.”
Naquele ano, o excesso de trabalho e uso de medicamentos provocaram em Ulysses uma crise mental que durou pouco tempo. Ele teve uma forte depressão.
Naquele ano, o excesso de trabalho e uso de medicamentos provocaram em Ulysses uma crise mental que durou pouco tempo. Ele teve uma forte depressão.
01/09/1988: Ao lado de vários parlamentares e sob uma chuva de
papéis, o presidente da Câmara dos Deputados, Ulisses Guimarães, é aplaudido na última sessão da Assembleia Constituinte. A
nova Constituição foi chamada de Constituição Cidadã, pelos avanços
sociais que incorporou em seu texto (Foto: Arquivo/Agência Brasil)
Junto com as medalhas, foi encontrado um texto escrito por Ulysses. Nele, o deputado falou sobre os avanços promovidos pela Constituição. “Leciona a história que, para os avanços sociais, não há retrocesso. Temporariamente, a violência pode estancá-los, mas a verdade e o homem triunfam sempre sobre a tirania. Os progressos emergem e a caminhada prossegue rumo à Justiça. A marca da Constituinte de 1988 é o reconhecimento da cidadania para o homem”, diz um trecho.
Veja no vídeo a seguir, do Memória Globo, as principais mudanças promovidas pela Constituição de 1988.
Redemocratização
Concluída a
"Constituição Cidadã", Ulysses se lançou candidato à Presidência em
1989. Ele não tinha apoio unânime do próprio PMDB e terminou em sétimo
lugar, com menos de 5% dos votos.
O ativismo político de Ulysses se manteve
durante o governo de Fernando Collor. No Congresso, teve papel
importante nas investigações que levaram ao impeachment em 1992. Naquele
mesmo ano, Ulysses decidiu levantar a bandeira do parlamentarismo e
rodar o país em busca de apoio. Estava com 76 anos.
Morte
Na sua última
viagem para discutir o regime parlamentarista, em 12 de outubro de 1992,
Ulysses forçou uma viagem de helicóptero arriscada, do litoral do Rio
de Janeiro para São Paulo. Durante uma tempestade, a aeronave caiu no
mar, na região de Angra dos Reis (RJ). No mesmo acidente morreram sua
mulher Mora Guimarães além do ex-senador Severo Gomes, a esposa e o
piloto. O corpo de Ulysses nunca foi encontrado.
As declarações de Ulysses Guimarães entraram para a história. Veja algumas das mais marcantes.
“Não se pode fazer política com o fígado, conservando o rancor e ressentimentos na geladeira. A Pátria não é capanga de idiossincrasias pessoais. É indecoroso fazer política uterina, em benefício de filhos, irmãos e cunhados. O bom político costuma ser mau parente.”
“A censura é a inimiga feroz da verdade. É o horror à inteligência, à pesquisa, ao debate, ao diálogo. Decreta a revogação do dogma da falibilidade humana e proclama os proprietários da verdade.”
"Governar é encurtar distâncias. Governar é administrar pressões, e as pressões primárias e diretas são as do lugar onde se vive, trabalha, estuda, sofre e ama."
“A grande força da democracia é confessar-se falível de imperfeição e impureza, o que não acontece com os sistemas totalitários, que se autopromovem em perfeitos e oniscientes para que sejam irresponsáveis e onipotentes.”
"Eu os abraço com a consagradora definição: Democracia é o convívio de contrários."
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